Um dia sem mexicanos


O filme é de produção mexicana/espanhola e estadunidense  e foi lançado em 2004. Dirigido por Sergio Arau o longa tem como argumento principal a inesperada e misteriosa desaparição de todos os hispânicos que viviam no estado da Califórnia, mostrando, a partir daí, todas as consequências desse sumiço em todo o país. O título centra nos mexicanos porque é assim que os estadunidenses em geral chamam qualquer trabalhador latino, sem levar realmente em conta sua verdadeira nacionalidade. Já começa por aí a crítica.

Com o fenômeno da desaparição dos latinos, depois de uma estranha névoa cair sobre a cidade, a vida dos californianos começa a virar um caos, pois pelo menos um terço da população sumiu. Os postos de trabalho importantes para a movimentação da vida e do comércio estão sem ninguém. A vida sem os trabalhadores vai mostrando que eles não são tão invisíveis como se quer fazer crer. Na verdade, eles sustentam a economia com a força de suas mãos.

O sumiço dos hispânicos afeta todos os âmbitos da vida e inclusive cria uma crise política já que o governador do estado também tem origem latina. Apenas uma mulher, latina de origem, não desaparece, e torna-se então a única possibilidade de solução do problema, virando uma espécie de cobaia. O desenrolar é bem divertido.

O filme de Sérgio é uma comédia, mas também é uma poderosa crítica, destacando o trabalho dos mexicanos e hispanos imigrantes na Califórnia, quase sempre servindo como mão de obra barata e eternamente assolados pelos maus tratos, seja por parte da polícia fronteiriça ou pelos estadunidenses comuns.

Um dia sem mexicanos desvela o racismo e principalmente aponta para a importância desses trabalhadores que os estadunidenses consideram como ilegais. Com graça, Arau desnuda a moral preconceituosa que vive em cada nativo dos Estados Unidos, bem como mostra o quanto os políticos de baixo nível se aproveitam disso para alcançar o poder.  Um trabalho bastante atual a considerar a escalada do preconceito contra os imigrantes durante o governo Trump. 

Bolívar e as dificuldades


A dica de hoje é o filme venezuelano “Bolívar, el hombre de las dificultades”, uma produção de 2013, dirigida por Luis Alberto Lamata. O argumento do filme está centrado justamente nas dificuldades que Simón Bolívar encontrou no início do caminho que trilhou para levar a cabo a libertação da Venezuela e depois de toda a América hispânica.

A história se passa no período entre 1815 e 1816, quando Bolívar, derrotado na sua primeira tentativa de separação da Espanha, segue em exílio para a Jamaica, onde vai enfrentar uma série de traições e tristezas, episódios que se repetiriam ao longo de sua curta vida.

Protagonizado pelo ator Roque Valero, esse Bolívar de Luis Lamata tem uma leitura bem próxima da realidade e foca muito mais no homem antes que o mito. E, nesse ano de exílio, que é fundamental para Bolívar, revela sua fragilidade na derrota, suas dúvidas e debilidades num momento em que tudo parecia perdido e sem saída.

Mas, é nesse ano também que Bolívar encontra aquele que viria a ser o principal responsável por todo o processo de libertação na América Latina: o general Alexander Petión. Ele era o então presidente do Haiti, país que havia protagonizado a primeira revolução negra vitoriosa de todo o mundo. E é partir dessa parceria com o imponente general que tudo muda. Petión oferece navios, homens e armas, e Bolívar está pronto para voltar à Venezuela onde irá garantir a libertação.

É um filme de rara beleza que mostra um Bolívar totalmente diferente do que estamos acostumados a encontrar nos livros de história. Um homem triste, solitário, mas decidido a mudar a face da América Latina. Um homem de fibra, mais que um herói. O ator que faz Bolívar, Roque Valero, representa de forma única o grande libertador. Não é o típico bonitão, mas um homem comum, tal qual foi Bolívar. Os atores todos são fantásticos e o final é arrebatador.

O filme está livre no Youtube. Vale ver.

No ano de 2020


Hoje vamos falar do filme “No mundo de 2020”, ou Soylent Green, seu nome em inglês. É uma produção dos anos 1970 que oferecia, então, uma visão de um futuro bem distante, ambientada no ano 2022, o qual agora está bem ali, na esquina.

O filme mostra o que pode acontecer num mundo onde o homem promove um sistemático processo de destruição da natureza e de si mesmo. Naqueles dias, em 1973, falava de um amanhã longínquo demais, pura ficção científica. E, como sempre acontece com a arte - que é a antena do humano – mostra o quanto o sistema capitalista de produção pode ser engenhoso e sagaz nas soluções que encontra para continuar se reproduzindo e lucrando com a maioria.

A história se desenrola a partir de uma investigação do detetive Robert Thorn, interpretado pelo lindo Charlton Heston, que em meio a uma crise de fome na cidade onde vive, investiga o assassinato de um executivo de uma empresa que produz comida sintética, uma espécie de tablete verde, conhecido como Soylent Green, aparentemente produzido a partir de algas modificadas. Nos anos 70 a fome mostrada no filme aparece como estarrecedora, mas, hoje, apareceria como estranhamente natural.

O ano da história é 2022 e a Terra está bem transformada. Na cidade de Nova Iorque, onde o filme é ambientado, vive gente demais, e o efeito estufa faz com que o calor seja algo insuportável. Na cidade populosa, os ricos se esbaldam em condomínios de luxo, onde belas mulheres são parte da mobília. Os pobres, como sempre, se amontoam nos lugares insalubres. Mas a comida está escassa para todos. Coisas naturais como frutas ou carne são impensáveis e só chegam mesmo na mesa dos ricos. Aos pobres resta o tablete verde, a ração. É nesse cenário que Robert começa sua investigação e na caminhada para descobrir o assassino, ele acaba desvendando um terrível segredo sobre a fabricação da ração humana.

Tudo se desvela quando seu companheiro de moradia, que já está velho, precisa ir para um lugar onde vão os velhos quando chegam uma certa idade. A retirada é obrigatória. Robert não se conforma e vai tentar descobrir a sorte do amigo. Mas, o que descobre é a matéria prima da ração que alimenta toda a cidade.

Soylent Green é um filme perturbador e encerra uma grande lição. Até onde podemos ir com a destruição? E até quando vamos permitir que uma parcela tão pequena da humanidade decida sobre a vida da maioria?

Esse é um filme que nos assombra e nos mobiliza. Vale ver.

A felicidade não se compra


A dica de hoje é um clássico do cinema, dos anos 1940. O título em português é “A Felicidade Não se Compra”, com o sempre charmoso James Stewart, dirigido pelo grande Frank Capra.

O filme conta a história de George Bailey, um homem admirado por todos na cidade, que abdica do sonho de estudar, viajar e conhecer o mundo para permanecer cuidando do legado da empresa em que o pai trabalhava antes de morrer. Naqueles dias, desesperado com a falência da empresa por conta das maldades de um homem rico e poderoso da região, ele decide então se matar. É aí que, na ponte onde planejava saltar para o abismo, acaba encontrando um candidato a anjo de nome Clarence, que vem do céu para fazer com que ele mude de ideia sobre o suicídio.

Para fazê-lo entender sobre a sua importância na vida da família e da comunidade, o anjo mostra a George como teria sido a vida de todo mundo na cidade se ele não tivesse existido e feito as escolhas que fez. Assim, começa a jornada do jovem protagonista, andando pelos lugares nos quais constituíra sua vida, mas agora sem ter existido, apenas como um espectador.

O anjo vai mostrando que sem a sua bondade e sua preocupação com as pessoas, muitas delas teriam tido suas vidas arruinadas ou bem diferente da que tinham quando ele estivera ali.

O filme, em preto e branco, é de uma delicadeza sem fim e passa a mensagem de que a vida é muito mais do que o dinheiro ou a fama. Os pequenos gestos, as pequenas obras, cada detalhe ínfimo da vida vivida em alegria e bondade tem a sua importância e acaba gerando muita beleza.

O final do filme, que é considerado um clássico de natal, é um final óbvio e esperado. O anjo consegue seu intento, que é o de ganhar asas, porque consegue convencer George a não se matar. E George acaba achando a saída para sua aflição.

Esse é um desses filmes imortais, que a gente vê milhões de vezes e sempre se emociona.