O sétimo selo


A dica de hoje é o filme sueco de 1956, "O Sétimo Selo", considerado a obra prima do diretor Ingmar Bergman. Narra a história de um homem, Antonius, que volta para sua terra depois de ter participado por dez anos das Cruzadas. Mas, o mundo que ele deixou não é mais o mesmo, tudo está destruído pela peste e pelo fanatismo. Nesse retorno ele se vê cara a cara com a morte, com quem faz um acordo: que ela lhe permita um jogo de xadrez e caso vença, só aí pode levá-lo. O filme se desenrola nesse tempo em que os dois vão travando a batalha no tabuleiro.

Mas o jogo é interrompido seguidamente pela vida mesma e o cavaleiro vai encontrando pessoas pelo caminho. Um grupo de artistas mambembe vai guiá-lo pelo interior de uma terra obscura e apocalíptica. Tudo está perpassado pela religião, que era o que comandava na idade média, período quando a história se passa. O homem, em luta com a morte, vai tentando encontrar sentido na existência, buscando deus ou o diabo, para compreender o que é viver.

O cavaleiro passa pelos lugarejos onde as pessoas lutam contra a peste, enfrentam seus demônios, vivem suas dores e loucuras. Observa a intolerância, o medo, a ação criminosa da igreja inquidora e nada dá a ele a resposta. Assim, em cada nova rodada do xadrez com a morte, ele vai se desesperando. Vê que o fim é inexorável.

A caminhada do filme é alegoria da vida no rumo do fim e é o fim que espera pelo cavaleiro ao final da partida, da qual a morte sai vencedora, como sempre. É tempo de cumprir a promessa. E depois de uma refeição num castelo onde ele encontra um velho amor e desfruta com amigos Antoniu volta a ficar cara a cara com a morte. Não haverá mais postergação. Com ele, a morte leva também todos os que estavam ao seu redor. Apenas um casal de artistas e uma criança se salvam, pois o homem, um desses artistas ingênuos e puro consegue ver a face da morte quando ela dá o xeque-mate no cavaleiro. Ele a reconhece e foge para longe. Há quem diga que Bergman quis mostrar com esse gesto que a vida, afinal, sempre vence, apesar da morte carregar um por um. E que a arte, na sua forma mais simples, é a que é capaz de abrir veredas por onde a vida pode florir.

O sétimo selo foi filmado todo em preto e branco, sem maiores recursos cênicos. O que vale nele mesmo é a atuação dos personagens, os diálogos intensos e profundos, o uso magistral da luz. Apesar de tão distante no tempo, o filme de Bergam é bastante atual, principalmente nesses tempos de fundamentalismo religioso e de pestes. A mensagem é dura: a morte está aí e não descansa. Mas, a vida é um grande presente e, enquanto podemos, devemos vivê-la com intensidade.

O sétimo selo pode ser visto no Youtube, na íntegra.


O lugar bom (The good place)


Para quem gosta de séries a dica é a produção estadunidense, criada por Michael Schur, exibida pela netflix com apenas quatro temporadas. Conta as aventuras de quatro seres humanos que morrem e vão para o que pensam ser o céu. Eles mesmos estranham a situação visto que na terra não tinham sido boas pessoas. Ainda assim, cada um vai tentando se adaptar naquele novo mundo e as circunstâncias fazem com que acabem se encontrando. Com o desenrolar da trama, descobrem que aquele céu é na verdade um experimento e passam a se deparar com a possibilidade de serem jogados no lugar ruim, que seria o inferno. Desde aí, tudo é aventura.

O bom da série é que na medida em que as coisas vão acontecendo cada uma das pessoas vai percebendo que pode ser melhor, que pode fazer boas ações, ser boa, enfim, merecer o lugar bom. Vão também construindo uma profunda amizade. E por aí os episódios se desenvolvem trazendo cenas muito divertidas, e personagens encantadores. O filósofo, a garota má, a invejosa e o bobão vão ganhando o coração do chefe do lugar, que é também apaixonado pelos humanos e, justamente por isso, disposto a fazer esse teste, visando levar mais pessoas para o lugar bom.

Os episódios são curtos e muito bem trabalhados. Tem a boa dose de comédia, mas não deixam de trazer momentos emocionantes. Fala-se muito em filosofia, ética e sobre o quanto vale muito mais a pena ser bom no mundo. Nesses tempos tão sombrios a delicada escrita de Michael Schur é um bálsamo para a alma.

Destaca-se também de maneira muito poética a visão teológica do roteirista, que apresenta uma ideia de céu e inferno bem interessante. Como a série é curta e tem um final logo na quarta temporada não é nada cansativo. Pelo contrário, ao encerrar deixa um gostinho de quero mais.

O último capítulo foi ao ar agora, no início de fevereiro, e conseguiu dar um destino absolutamente lindo para todos os personagens. Depois de desfrutarem as aventuras da criação de uma nova lógica para entrar no céu, eles também conseguem desfrutar de milhares de anos de alegria no lugar bom, para, por fim, se reintegrarem ao cosmos.

A série é delicada, cheia de ternura, alegre e de uma boniteza sem fim. Os atores são ótimos, com especial destaque para Manny Jacinto, o ator filipino/canadense que faz o adorável, louco e divertido Jason. Vale conferir.